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Coletivo Uma Terra Só finaliza hino próprio e projeta álbum colaborativo

Atualizado: 19 de mai. de 2024

Grupo está na ativa há cerca de um ano e proporciona oportunidade, visibilidade e intercâmbio cultural para artistas


Montagem com diversos artistas do coletivo Uma Terra Só
Aquiles Reis, Paulinho Pedra Azul, Toninho Horta, Sérgio Andrade e Saulo Laranjeira são alguns dos 650 nomes que formam a “tribo de uma terra só” | Foto: Montagem/Arquivo pessoal

O coletivo Uma Terra Só, criado em 13 de fevereiro de 2023, está nos ajustes finais da gravação e produção de um hino que levará o nome do conjunto e marcará o primeiro lançamento do grupo nas plataformas digitais. A canção foi composta por diversos letristas e musicistas, e está sendo produzida pelo músico, produtor e compositor belo-horizontino Marcelo Fonseca, além de contar com a produção executiva do violeiro e compositor Chico Lobo, também de Belo Horizonte, MG. Segundo o poeta, letrista e compositor gaúcho Carlos Di Jaguarão, um dos idealizadores desse grupo de WhatsApp, o projeto é lançar a música como single em maio, nas plataformas digitais, e depois começar a montar um álbum colaborativo com faixas de diversos integrantes do coletivo. Tanto o single quanto o álbum serão lançados pela gravadora Kuarup, de São Paulo.

 

O Uma Terra Só foi criado com o objetivo de juntar artistas de diferentes estados do país e do exterior em um espaço virtual, assim proporcionando uma troca cultural e discussão do atual cenário musical brasileiro. Priorizando compositores regionais e mesclando os iniciantes com outros que têm carreira consolidada, o coletivo juntou ritmos que variam entre música popular brasileira (MPB), samba, jazz, blues e outros gêneros. Em meio a essa massa plural de culturas, o artista pode ter o trabalho autoral divulgado. “É um lugar de expor os trabalhos de todo mundo. Quando a gente não tem esses ‘multi-streamings’ com números gigantes, nós temos que buscar nos ajudar entre os artistas. Acho que o Uma Terra Só é um lugar para a gente se ajudar mais e se articular melhor para chegar a alguns lugares diferentes”, diz Fonseca.

 

O músico e compositor João de Ana, natural de Pedra Azul, MG, e que está no projeto desde o início, teve um papel importante no que diz respeito à expansão do grupo e entrada de outros musicistas. De acordo com Chico Lobo, que também é integrante desde o princípio, “o coletivo inicia com 20 artistas, e começa-se, então, a abrir. Cada um que tinha um artista amigo, uma artista amiga, alguém que tinha algo relacionado com a música, podia convidar abertamente. A partir do momento em que alguém convidava um novo integrante, isso era mandado para o João de Ana ou para o Carlos, que eram os dois que tinham o controle de aceitar as pessoas”.

 

Em decorrência do crescimento do número de membros, criou-se outro grupo de WhatsApp para pensar estratégias e funcionar como diretoria. Algumas ideias vieram a partir daí, como a implementação de uma playlist no Spotify e no YouTube com duas músicas de cada artista e o estabelecimento de parcerias com programas de rádios web. Com o andamento do projeto, houve uma expansão dos contatos para que os músicos independentes pudessem se aproximar dessas emissoras de rádio e das revistas eletrônicas, o que possibilitou a chegada das canções a outros países, a exemplo da Rádio Shiga, do Japão. Lobo acredita que, nesse processo, não só os artistas se beneficiam, mas as emissoras também, visto que são divulgadas por aqueles, formando uma via de mão dupla em que todos ganham.

 

Composição e produção

Violeiro Chico Lobo
Chico Lobo foi quem deu a ideia para a composição de um hino para o Uma Terra Só | Foto: Marcelo Fonseca/Arquivo pessoal

O violeiro Chico Lobo fez os primeiros versos do hino e postou no grupo, que foi complementando até terminar a letra em dois dias, contando com as contribuições de Carlos Di Jaguarão, Genésio Tocantins, Marfiza, Deborah Rosa, Josecé Alves, Nil Lus e Oswaldo Rios. Para a composição da melodia, criou-se outro conjunto virtual apenas para  discutir como seria a música, por conta da complexidade dessa etapa. Lobo selecionou os músicos Carlos Farias, Célio Cruz, Flávio Colares e Wagno Simões para a composição da harmonia. “O hino foi muito interessante, pois ele foi a expressão que deu vida àquele coletivo. Foi a primeira ação concreta que disse ‘aqui tem um coletivo que está a fim de caminhar juntos’”, diz Lobo. Segundo os idealizadores, coletividade, identidade e humanidade são ideais que marcam a obra, que está dentro do gênero da MPB.

 

A produção musical é feita na cidade de Lagoa Santa, MG, por Marcelo Fonseca, que entrou no Uma Terra Só por meio de João de Ana. Além de pensar e organizar as melodias, coube a ele o papel de orientar os músicos e não deixar as captações serem enviadas a ele de maneira mal-executada. Fonseca conta que há uma série de coisas que tornam a produção dessa canção diferente da convencional, a exemplo do número maior de músicos e compositores com quem ele tem de lidar, o que torna o processo mais complexo. Outro aspecto incomum desse procedimento é o tempo indefinido para a produção, pois, por se tratar de um projeto voluntário, a gravação do hino depende da disponibilidade de cada artista que se apresentou para contribuir. 


No que diz respeito à construção da lógica musical, devido às diversas sugestões de arranjo, Fonseca teve de repensar algumas partes da melodia. “Não são [mudanças] tão drásticas, tipo ‘o cara fez outra música’, mas no sentido de ‘as definições limparam as coisas, criaram-se partes, onde não tinha nada no meio, a gente criou’”, afirma o produtor. Ele menciona João de Ana, que gravou voz e violão, como um músico que trabalhou junto dele na definição das harmonias e melodias, visando registrar a base para facilitar ao restante dos musicistas que fossem contribuir. Eles reproduziram o que o músico pensou originalmente com a guia musical, isto é, o registro primeiro, o qual leva a harmonia ao conhecimento do produtor, definiram as melodias e o que ainda estava incompleto, escolheram outros acordes que se encaixavam melhor e gravaram suas partes. Chico Lobo também contribuiu nesse processo, gravando voz e violas, além de atuar como produtor executivo, que é quem articula com os musicistas, negociando disponibilidade e outras questões.

 

João de Ana conta que a experiência de participar do tecimento do hino no estúdio foi tranquila e divertida. “O Marcelo Fonseca é um amigo de algum tempo, já tocou comigo várias vezes. Eu falei para ele: ‘Não sou músico de estúdio’. Eu sou o músico de palco, mais naquela coisa de sentir a energia do público e do músico que está tocando comigo. Ele falou ‘não, cara, vamos lá, você vai ficar super à vontade. Você tem um jeito de tocar violão que é só seu, é a sua pegada, o seu jeito. Isso vai contribuir muito para a música’”, relembra. 


Apenas João de Ana e Lobo gravaram suas partes no estúdio de Fonseca, localizado em Lagoa Santa, por morarem próximos. O restante dos musicistas captou suas seções de maneira remota e enviou ao produtor, que tem o trabalho de organizar as partes de cada um. “Cada artista procura seu melhor jeito. Ou ele vai a um estúdio profissional e grava sua parte, tanto de instrumento quanto do vocal, ou ele usa seu próprio home studio. E eu avalio se está em uma qualidade boa”, explica Fonseca.

 

Importância e impacto

Músico João de Ana se apresentando com um violão
João de Ana diz que alguns grandes nomes da MPB já o chamaram para fazer parcerias por meio do Uma Terra Só | Foto: Lucca Jordan/Instagram @luccafotografiaa

A visão dos integrantes do Uma Terra Só é positiva quanto à importância e ao impacto do projeto na carreira deles. João de Ana conta que “estava todo mundo com sede de encontrar meios para as canções ganharem asas e voarem para mais longe. E o coletivo proporcionou isso através das parcerias, dos amigos”. Com uma carreira profissional de cerca de 30 anos, o musicista diz que, antes de fazer parte do coletivo, seu trabalho circulava mais por Minas Gerais e menos em outras localidades, o que mudou ao ingressar no projeto, com suas composições passando a ter um alcance maior em outras regiões do Brasil e em outros países. Já Fonseca diz que o processo de ascender no cenário musical depende de espaço para mostra do trabalho, de público interessado naquilo e organização dos artistas. “Considerando que as coisas são assim, o Uma Terra Só vem para fechar esse círculo de organização, para os próprios artistas se conhecerem e começar divulgando. Se nós não nos ajudarmos, não tem jeito de articular com essas grandes empresas”, opina.


Di Jaguarão afirma que alguns artistas conseguem dar uma projeção maior para a carreira por meio do coletivo, e que depende de cada artista usufruir dos benefícios de fazer contatos e parcerias dentro do projeto. Ele diz que “está acontecendo algo muito interessante, por exemplo, um artista faz um show em São Paulo e convida mais três ou quatro do coletivo. O pessoal do MPB4 já convidou artistas do coletivo para abrir shows, o MPB4 está lá, na figura do Aquiles Reis”. O poeta diz que essa irradiação demora certo tempo, mas já está acontecendo. “Acho interessante um artista de Roraima, por exemplo, fazer um trabalho com um daqui do Sul, ou de Minas. Já está aparecendo parcerias gravadas. Acho muito enriquecedor esse processo de pessoas com culturas tão diferentes poderem se conhecer dentro de um espaço virtual”, afirma.   


Aquiles Reis destaca o ineditismo do coletivo e afirma que ele é importante, pois propicia a chegada das composições dos artistas aos ouvidos de pessoas que não as conheceriam se o projeto não existisse. O membro do MPB4 também relaciona a massa plural de musicistas presente no Uma Terra Só com a qualidade da música brasileira, a qual considera a melhor do mundo, e diz que o sucesso da MPB é intrínseco à sua diversidade, que advém do fato de ser diferente em cada parte do país. Ele relata que o grupo “é necessário porque contempla essa grandiosidade numérica de compositores e compositoras, cantores e cantoras, instrumentistas. Compõe o quadro atual do que seja a diversidade da música brasileira”.

 

Impacto na indústria

O grupo musical MPB4
Os já consolidados membros do MPB4 dão oportunidade a artistas desconhecidos pela grande mídia | Foto: Divulgação

Os integrantes do projeto concordam que o propósito não é necessariamente confrontar a indústria fonográfica, devido à grandiosidade dela, e sim, realizar articulações para, de fato, fazer a música chegar aos streamings. Na visão de Fonseca, o Uma Terra Só seria mais um veículo, mais uma possibilidade, em que a articulação é exercida pelos artistas que o integram. Ele enxerga uma progressão, que iniciou com esse veículo de divulgação, cresceu a partir de contatos com emissoras de rádio pelo mundo e alcançou o patamar da feitura de um álbum.


João de Ana acredita que o coletivo está conseguindo fazer certo alarde em relação a alguns pontos que poderiam melhorar na indústria, a exemplo da questão dos créditos aos artistas que, na maioria das vezes, não consta nas plataformas digitais. “Eu acho que o objetivo do coletivo é unir forças e questionar: ‘Por que isso está acontecendo? Isso está errado. Será que não é possível consertar isso?’ Então, nesse sentido, acho que nós já fazemos um barulho muito bom”, comemora.

 

Aquiles Reis concorda com tal posicionamento do grupo, acrescentando que a luta está em mostrar o tipo de registro fonográfico que a grande mídia oculta ou disponibiliza com menos visibilidade em comparação a outros. “Há décadas, a música brasileira saiu do radar da mídia. Isso é péssimo. O que se faz hoje com a música brasileira é um crime cultural, porque priva as pessoas de saberem que a música continua sendo feita por um número muito grande de pessoas”, afirma. Aquiles não acredita que a MPB esteja passando por uma crise, mas que falta à mídia o papel de divulgá-la, o que proporcionaria à sociedade a oportunidade de conhecer os novos artistas.

 

Como mencionado por Di Jaguarão, o MPB4 é um grupo que ajuda na projeção de outros artistas, seja chamando-os para abrir os shows da banda ou participar propriamente de suas apresentações. Aquiles conta que existe um acordo na banda de sempre mencionar musicistas pouco conhecidos em entrevistas que eles concedem. Ele menciona os artistas Breno Ruiz, Ilessi, Luisa Lacerda, Paulo Francisco Paes, Guinga, Riáh, Serginho Farias, além da dupla Kleiton & Kledir, que tiveram algumas composições gravadas pelo MPB4 e participaram de uma turnê completa.

 

Futuro

Print da entrevista de Caio Alves com Aquiles Reis
Aquiles Reis critica a grande mídia e diz que projetos como o Uma Terra Só são necessários à democratização da MPB | Foto: Caio Alves/Captura de tela

Atualmente, o Uma Terra Só é composto por cerca de 650 integrantes em duas modalidades de participação, sendo uma o chat do WhatsApp, onde acontece o intercâmbio de músicas e divulgação dos programas, e a outra o mural informativo, em que são passadas todas as informações relativas ao grupo. Agora contando com mais de 100 contatos de emissoras regionais, nacionais e internacionais, o coletivo alcançou progresso nos quesitos crescimento e impacto, no desenvolvimento dos projetos e nas parcerias, estando cada vez mais interligado por artistas de todas as partes do Brasil. 


Recentemente, o coletivo passou por um processo de profissionalização, com a criação de mais um grupo virtual para difusão de trabalho e coordenação, o estabelecimento do pessoal do marketing para a criação de flyers de divulgação, além da parceria com a Quae, empresa de distribuição digital que auxilia os artistas a colocarem seus trabalhos nas plataformas e apoia o Colab Pro 2024, um projeto que visa à separação das músicas e ao envio de releases contendo as informações dos artistas para as emissoras, de maneira mais estratégica e conceitual. Tal projeto é possível a partir da contribuição financeira de alguns integrantes para pagar a mensalidade. 


Também há a articulação com outros projetos, como a meta de alcançar 120 emissoras em seis meses e a possibilidade de uma feira de música, esquema já escrito pelos organizadores e que está na etapa de captação de recursos a partir de leis de incentivo. Outro anseio é a realização de um festival, para extrapolar o virtual e promover um encontro presencial entre os artistas.


Aquiles Reis considera o Uma Terra Só “uma atuação fundamental, que precisa ser mantida. É um trabalho gigantesco feito em pouquíssimo tempo e precisa ser estimulado por quem está associado ao grupo, por quem acredita que possa, de fato, seguir em frente”. Para o cantor, a imposição de certos tipos de música exercida pela mídia prejudica não só os artistas que não têm seu trabalho conhecido, mas também o povo brasileiro, que fica restrito, de certa forma, a alguns gêneros em detrimento de outros. Projetos como o Uma Terra Só nascem para tentar mudar tal cenário, visando dar força aos músicos e compositores e à MPB, que nunca parou de ser produzida nem perdeu em qualidade.

14 Comments


joaodeanampb7
Apr 26, 2024

Parabéns Caio!! Matéria linda sobre o coletivo Uma Terra Só 🌎.

Muito obrigado, e viva a música popular brasileira!!

Escutei nos Discos!! Vida longa!!

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Caio Alves
Caio Alves
Apr 26, 2024
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Muito obrigado pelo incentivo e pela entrevista!

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Roberta Vargas
Roberta Vargas
Apr 26, 2024

Excelente matéria!!! 👏👏👏

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Caio Alves
Caio Alves
Apr 26, 2024
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Muito obrigado!

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aquilesmpb4
Apr 25, 2024

Parabéns, Caio! Bela matéria! Agradeço as referências ao MPB4 e a mim. E viva UTS!

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Caio Alves
Caio Alves
Apr 26, 2024
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Muito obrigado, Aquiles! Foi uma honra te entrevistar para a feitura dessa matéria. Gratidão!

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aquilesmpb4
Apr 25, 2024

Parabéns, Caio! Bela matéria! Agradeço as referências ao MPB4 e a mim. E viva UTS!

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Luciene Teixeira
Luciene Teixeira
Apr 16, 2024

Parabéns pelo blog, Caio! Muito bom!

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Caio Alves
Caio Alves
Apr 17, 2024
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Muito obrigado, Luciene!

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Blog editado por Caio Alves, graduando em Jornalismo na Universidade Federal de Uberlândia (UFU).

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